Brasil, uma das Economias mais Fechadas do Mundo


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O Brasil é uma das economias mais fechadas do mundo. Engraçado dizer isso e até parece um contrassenso, visto que somos um dos maiores exportadores de alimento do mundo. A questão está do outro lado da balança comercial, nas importações. Ao olharmos em valores monetários, importamos pouco ao compararmos com nosso PIB e exportamos “mal”, ou seja, produtos de baixo valor agregado, como soja, milho e carne. Até mesmo com jogadores de futebol fazemos o mesmo, exportamos a matéria prima e para serem lapidadas lá fora, valendo até dez vezes mais em alguns anos. Claro que temos casos de sucesso, como a Embraer, empresa que alcançou recentemente o posto de maior vendedora de jatos executivos nos EUA, um exemplo de que a abertura comercial é benéfica, se as fundações forem bem feitas. O Brasil está certo de ser fechado comercialmente falando?

Ranking dos 15 primeiros produtos exportados em 2022 pelo Brasil (Valores FOB em US$Bi) – Soja, petróleo e minério de ferro correspondem à cerca de 35% da exportação brasileira


 Fonte: MDIC

Ao longo de muito tempo, economistas aprovaram a ideia dos benefícios (inegáveis) da abertura comercial. Mesmo assim, hoje vemos um movimento nacionalista forte no mundo (e até mesmo uma redução na abertura das fronteiras), que possuem raízes políticas é claro, mas também econômicas. A população já não percebe mais tanto estes benefícios do free trade. E quem está correto?

Brasil está no fim da lista de abertura comercial do G20 segundo os dados do Banco Mundial – Índice reflete o total Exportações e Importações como percentual do PIB (2021)

 

Fonte: Banco Mundial

Países do G20 - É necessário analisar os dados de maneira detalhada. Dentre os países com valor de PIB semelhante (Índia, França, Itália, Brasil, Canadá, Reino Unido) o Brasil possui o menor nível de abertura comercial, pelo baixo volume de importações, impulsionado por barreiras e tarifas de importação

 
Fonte: Banco Mundial

O caso do Brasil

O passado tem um peso muito grande sobre a nossa presente abertura comercial. Primeiramente, sempre exportamos produtos de origem agrícola. Tivemos o momento do café, da cana-de-açúcar e mais recente, da soja e do milho. Do outro lado, principalmente na República Velha, dependemos sempre de importações de bens manufaturados, que passaram a ser taxados ao longo do tempo, visando fortalecer a indústria nacional. A partir de 1930, temos o caso emblemático do Processo de Substituição das Importações. Basicamente, o programa instituía diversas medidas protecionistas de forma à produzir internamente os bens importados, mesmo que fossem muito mais caros e nossa mão de obra não fosse qualificada. À época, nossa produção industrial era praticamente zero, e aparentemente esta era a única maneira de forçarmos a produção interna. Não vejo um erro tão grande nisso para a época, o problema é adotarmos sistemas e ideias semelhantes até hoje, impactando diretamente em nossos volumes de importação e algumas vezes na exportação (recentemente tivemos o imposto de exportação de petróleo por exemplo).

Se olharmos para 1 mês atrás, acredito que isto lembra algo sobre Shein e Aliexpress? Nosso governo segue fazendo as mesmas coisas do passado.... Protecionismo sem parar, aumento de tributos e gastos governamentais. Mas se olharmos de maneira racional, em um primeiro momento o subsídio (protecionismo) é vantajoso, o problema é a falta de evolução para que os setores produtivos não continuem a depender de intervenções governamentais para sobreviverem. Isto significa que no setor industrial não é capaz e precisa de uma “ajudinha”? É isso? Eu gostaria de dizer que sim, que somos incompetentes e dessa maneira ficaria até feliz com medidas de proteção. Mas não, vide o caso da Embraer. Uma empresa de um produto altamente tecnológico montado no país (existem componentes que são importados), mas nós agregamos o valor no produto, a marca é nossa, incrível. E como chegamos lá? Passo número 1, o governo pulou fora da empresa. Ainda é acionista, mas com reduzido poder de voto, semelhante ao ocorrido com a Eletrobras, que o governo tanto tenta andar para trás. Passo número 2, a empresa se relaciona com o exterior ativamente. Ou seja, importa componentes e exporta aeronaves, agregando valor, mesmo que não seja um produto destinado exclusivamente ao mercado interno. 

Reforço minha tese de não ser contra medidas que ajudem a indústria nacional à prosperar em um mercado de alta competitividade, mas precisamos pensar em maneiras de não dependermos deste subsídios no futuro. Assim como precisamos de mecanismos que façam famílias não dependerem do Bolsa Família no longo prazo. Mas como já escutei antes, não existe nada tão permanente do que um subsídio no Brasil. O patriarcalismo é enraizado, com todos os setores buscando suas benesses dia após dia e este é mais um dos receios com a reforma tributária. Quando tentamos criar indústrias que atendam exclusivamente o mercado interno, sem estar em sua paridade com o setor internacional, o país não evolui. Afinal, qual o incentivo de alguém ser mais produtivo se existe uma reserva de mercado? Qual foi o incentivo da Petrobras durante anos ser mais competitiva, se o preço era congelado e não havia competidores? Zero para ambas as perguntas. Em todos os meus textos eu bato na tecla, os agentes reagem à incentivos.

Tarifas de Importação média por país do G20 (2020) – Brasil é o primeiro no ranking de tarifas de importação, tendo quase 6 vezes mais do que os Estados Unidos e atrás inclusive da Argentina

 

Fonte: Banco Mundial / Dados de México, Zona do Euro e Arábia Saudita não estavam disponíveis

Abertura comercial – Bom ou Ruim?

Comecemos com um pouco de história. David Ricardo, um dos pais da economia, a partir das ideias de Adam Smith, trouxe o conceito da vantagem comparativa. Ou seja, países que possuíssem alguma vantagem relativa (leia-se, menor custo de oportunidade) em algum produto, se especializariam em produzi-lo. Nada mais claro quanto a Alemanha produzir carros e o Brasil soja. Seria um desperdício utilizar os industriais alemães para produzir soja, ou simplesmente não aproveitar as terras brasileiras para tal, ou seja, o custo de oportunidade seria alto, do Brasil se especializar em carros e a Alemanha em soja. Claro que este conceito tem limites, mas radicalismos a parte, faz sentido pensarmos que a especialização nos traria ao comércio internacional, cada um fornecendo o de melhor para o mundo. Ou seja, toda a economia ganha.

“David Ricardo argumentou em 1817, que mesmo se a China fosse mais produtiva em tudo (ou Portugal na época), não seria possível produzir tudo, porque os outros países não venderiam nada e não teria dinheiro para comprar os bens chineses” do livro Boa Economia para Tempos Difíceis. Esta frase implica em um outro ponto sobre a vantagem comparativa e abertura comercial. Segundo o conceito, setores menos produtivos não serão desenvolvidos dentro das nações, mas todos os países produzirão algo. Ricardo também nos ajuda à entender que países em desenvolvimento podem se beneficiar da abertura, pois setores que demandem mão de obra massiva, se estabelecerão em países mais pobres (maior disponibilidade de mão de obra barata), aumentando os salários dos trabalhadores (em comparação com a economia fechada). Por outro lado, o país sem mão de obra barata perde e os salários também (caso de países ricos). Isto explica bem a relação China x EUA e parte da insatisfação de trabalhadores/indústrias norte-americanas. Trabalhadores menos qualificados perdem mais nesse caso, pois competem (in)diretamente com um chinês do outro lado do mundo.

Pelo exposto acima, assim como o Teorema de Stolper-Samuelson aponta, com a abertura comercial, a economia global deveria crescer e a desigualdade cair em países pobres (e aumentar em ricos), mas na prática, é um pouco difícil de provar. A Índia, por exemplo, abriu sua economia em 1991 e logo em seguida teve uma queda expressiva em seu PIB, seguido por aumento modesto. A China, ao redor do ano de 2000, passou à se estabelecer como uma grande potência global de comércio, mas a desigualdade subiu. Brasil também viu sua desigualdade subir entre 1985 e 2000, e só viu cair após isto, com o superciclo das commodities (lembro que não só o Brasil reduziu sua desigualdade... Foi um efeito global, ou seja, não, não foi o PT). 

Mesmo assim, segundo muitos economistas (com auxílio da econometria), é difícil observar um efeito muito negativo, fruto da abertura das economias, ou seja, podemos ainda entender que os benefícios superam os prejuízos (no aspecto global), principalmente no ponto da produtividade. Claro, que alguns sairão prejudicados em uma eventual queda de tarifas de importação, mas os benefícios à longo prazo podem ser alcançados, assim como o caso da Embraer, que demorou cerca de 40 anos para atingir a liderança em jatos executivos nos Estados Unidos. Toda política econômica tem prós e contras, e dizer que o comércio internacional é 100% benéfico não acho razoável, mas o excesso de protecionismo muito menos. A parte ruim disso, é que dependemos da política para avançarmos na abertura comercial. E ela nada mais é do que um grande balde de interesses, na qual pouco importa o benefício ou prejuízo, como vemos diariamente em Brasília.


Fontes

OCDE

Why open markets matter - OECD

Comércio Internacional

A primeira (e mais importante) lição do comércio internacional | Terraço Econômico (terracoeconomico.com.br)

Benefícios superam custos de uma abertura comercial brasileira | Poder360

Trade Openness and Growth: Who Benefits? | Oxford Review of Economic Policy | Oxford Academic (oup.com)

The Case for Trade Liberalization in Developing Countries (aeaweb.org)

Global Trade Liberalization and the Developing Countries -- An IMF Issues Brief

Livro – Boa Economia para tempos difíceis

Book Review: Good Economics for Hard Times: Better Answers to Our Biggest Problems by Abhijit V. Banerjee and Esther Duflo | LSE Review of Books

Forum Econômico

WEF_TheGlobalCompetitivenessReport2020.pdf (weforum.org)

Processo de Substituição de Importações

(Microsoft Word - Cap\355tulo 11 - Ultima Pedro Dutra Fonseca _2_.doc) (ufrgs.br)

MDIC

Comex Stat - ComexVis (mdic.gov.br)

Embraer

Embraer torna-se líder de jatos executivos nos EUA | A TARDE

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