O problema (ou não) da imigração
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Toda vez que uma guerra começa,
algumas perguntas são feitas. Qual será o impacto para a economia global? Quem
sairá vitorioso? Quantos refugiados teremos? Está última, é a que traz o gancho
para o artigo de hoje. Um refugiado, nada mais é do que um imigrante forçado,
assim como muitos fugitivos das Guerras Mundiais que vieram ao Brasil formar as
mais diversas colônias, dos bairros paulistas do Bixiga à Liberdade. Quantos de
vocês leitores não possuem alguma descendência de algum europeu. A pergunta que
não quer calar é, a imigração é algo bom para as economias? Como economista, eu
sempre tive esta dúvida. A resposta, como para muitas perguntas que faço em
meus artigos, não é simples, e caiu nos holofotes dos tabloides nos últimos
anos. Importante pontuar que este texto não pretende tratar da xenofobia ou das
diferenças culturais, e sim dos efeitos econômicos da migração, principalmente
o efeito nos salários dos nativos.
Guerra contra a imigração
Donald Trump nos EUA, Erdogan na
Turquia e o Boris Johnson no Reino Unido, possuem algo em comum. Os três possuem ideias
nacionalistas e são (em alguma maneira) contrários à imigração. Nos Estados
Unidos, o “Let’s make America Great Again” junto com o muro na fronteira com o
México e no Reino Unido, o Brexit. Ambos trazem em suas entrelinhas a
valorização do americano e do britânico, contrariando as ideias de imigração.
Dominic Cummings, um dos responsáveis pela votação para a
saída do Reino Unido da EU, utilizou de algoritmos que influenciavam o eleitor
à aceitar a ideia nacionalista na Inglaterra, slogans como “Eles roubaram seu
trabalho” eram comuns. Nos EUA recentemente, contrariando inclusive sua campanha
eleitoral, Biden aprovou o aumento do muro com o México e perguntado sobre se
seria efetivo, a reposta foi “não”. Mas é complicado, a sociedade adotou esta
postura.
Postura esta que foi se formando
ao longo do tempo, com raízes até mais profundas. No mundo todo tivemos
eleições que romperam o status quo ao redor de 2016 à 2018. A
sociedade, cansada de governos corruptos, condições de vida em declínio e da
democracia como ela vinha sendo conduzida, elegeu candidatos com vieses
autoritários. A extrema direita, que muito foi ridicularizada no passado,
surgiu como uma possível alternativa, visto que o que vinha sendo feito já não
dava mais certo. Mesmo onde não venceram as eleições, candidatos extremistas
chegaram próximo ou incomodaram, e muito. E como tudo se polarizou, a discussão
da imigração também não foi diferente. O Brexit (assistam o filme sobre
o assunto, muito bom) se apoiou muito nesta ideia contrária aos imigrantes, se
aproveitando de uma economia estagnada à praticamente 10 anos. O imigrante
roubou seu trabalho, diziam os panfletos. Let’s make America (Britain) great
again.
Imigração e Economia
Os ganhadores do Nobel de 2019 escreveram um belíssimo capítulo sobre o tema em seu livro Boa Economia
para Tempos Difíceis e me aproveitarei de dados e algumas ideias deles as quais
concordo. Em primeiro lugar, o problema da migração é bem menor do que se
imagina ao observarmos o painel geral. O percentual de migrantes no mundo é de
apenas 3% da população global, sendo que a maioria é fruto de ofertas de
emprego ou migrações legais. O problema vem da propaganda. Pesquisa realizada
na Itália apontou que o italiano acreditava que cerca de 26% do país eram
imigrantes, quando na verdade o dado real era de 10%. Le Pen, antes da eleição
de 2017 na França, apontava que 95% dos imigrantes no país viviam sob
assistência do governo e não trabalhavam, mas na verdade este número era de
45%.
A lógica mais simples (e falácia)
utilizada pelos governantes é a de que o imigrante (de baixa qualificação)
vindo ao seu país, roubará o emprego dos nativos, reduzindo assim os salários
dos nativos. Parece que faz sentido é verdade, como a mais pura lei da
oferta e demanda. Apesar disto, a diferença de salários entre países pouco tem
a ver com a imigração e o mercado de trabalho não segue as leis mais convencionais da
oferta e demanda, sendo um mercado totalmente diferente do comum. Se fosse
verdade que todos os migrantes buscam roubar o emprego de alguém para ganhar
mais, porque todas as pessoas não saem do interior em direção à São Paulo? No
auge da crise na Grécia ao redor de 2012, com desemprego de jovens em 50%,
poucos gregos emigraram. A verdade é, é difícil largar seu país e boa parte dos
emigrantes fogem de situações de guerra ou violência.
Vários economistas buscaram
avaliar se fluxos migratórios reduziam os salários dos nativos e a conclusão
foi que não, inclusive sendo opinião consentida pela Academia Nacional de Ciências do
Estados Unidos. Um dos artigos mais famosos sobre o tema tem a ver como Êxodo
de Mariel. Em 1980, cubanos foram permitidos à emigrar aos EUA, mais
especificamente à Miami, aumentando em 7% a população da cidade. Resultado nos
salários dos nativos de baixa qualificação? Nenhum estatisticamente comprovado.
Na Dinamarca, estudos foram realizados em locais que recebiam refugiados, e
também nenhuma relação comprovada. Claro que existem economistas contrários,
mas à principio, o consenso é de que não há impacto, indo de encontro aos
discursos inflamados de políticos, com zero embasamento, afinal a terra é
plana, não é mesmo. Mesmo assim, por que será que a lei da oferta e demanda não
vale neste caso?
Em primeiro lugar, um novo fluxo de pessoas causa não apenas um aumento da oferta de trabalho, assim como um aumento na demanda por produtos. As famílias gastam dinheiro, compram roupas, alimentos, entre outros. Automaticamente isto cria empregos. Quantos restaurantes para brasileiros já não vimos nos EUA? O problema surgiria se boa parte do dinheiro fosse repatriado ao país de origem e não gasto localmente. O segundo ponto, vem do uso da mão de obra migrante para empregos específicos. Criam-se novos postos de trabalho e o nativo passa a trabalhar em posições mais qualificadas, assim como o que ocorre nos EUA. Além disso, por exemplo, uma maior disponibilidade de babás à preços mais baratos, pode permitir a mãe (nativa) trabalhar fora de casa, aumentando assim a renda familiar. Muitas vezes o nativo e o imigrante não são competidores Terceiro ponto, vem do empreendedorismo, quantas cidades do mundo não possuem uma China Town? Pai de Steve Jobs era sírio, Sergey Brin russo e o pai adotivo de Jeff Bezos cubano. Dentre as 500 maiores empresas dos EUA, 43% foram fundadas por imigrantes (2017). Surpreendente não é mesmo. A conclusão é que economicamente falando, pouco do que políticos bradam sobre o assunto é correto. Mas claro... Isto é longe de ser novidade.
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